Mário, o pirata

Publicado originalmente em O Estudante do Coração; ensaios sobre a arte pós-moderna. 1ª ed.: Rio de Janeiro: Quártica, 2010. 2ª ed.: Rio de Janeiro: Litteris, 2013.

Existe um cineasta, nos primórdios do cinema brasileiro, que, totalmente alheio a Oswald de Andrade e suas pesquisas, mesmo assim devorou a vanguarda cinematográfica europeia e produziu nosso primeiro filme antropofágico, em 1929/30: Limite; seu nome é Mário Peixoto. Depois disso ele nunca mais conseguiu filmar. Situação exasperante, para um diretor admirado por Einsenstein, Pudovkine e Orson Welles, e que só o Brasil poderia criar. Imagine-se a recepção que pode ter dado a este poema de luz totalmente experimental (com visões de partículas quânticas e de geometria fractal em suas desarvoradas e velozes folhagens e no mar de tempestade que é a própria história do filme) quando de seu lançamento em 1931. Em 1934, outro boicote: Mário Peixoto publica seu romance O inútil de cada um pela editora Schmidt; romance truncado e depois recolhido pelo pai do autor e pelo editor Augusto Frederico Schmidt, a conselho de Manuel Bandeira. Desiludido, isolado, casmurro, Mário Peixoto se isola na Ilha Grande-Abrahão, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro, na Casa do Morcego, construída em 1629 pelo pirata espanhol João Lourenço; propriedade que o cineasta adquiriu e restaurou, e que depois foi destruída. Mário Peixoto não dava entrevistas, não recebia quase ninguém, nem se deixava fotografar ou filmar. Por ocasião do lançamento da nova versão de seu romance, em 1984, concedeu em uma pequena conversa com o repórter da tv Globo, na qual falou muito pouco e só deixou que sua sombra aparecesse para a câmera. Este relançamento seria a coroação de seu trabalho criador, tantas vezes e de tantos modos sabotado; não era mais o volume único original, e sim a retomada de toda sua vida e de tantos projetos, um balanço, um legado, uma espécie nova mas que nos traz à memória À la recherche du temps perdu, de Proust.

O romance é cinematótico de uma maneira toda especial, e cria imagens-cristais também; como a obra de Proust, trata eminentemente do tempo, e não da memória.

Para dar conta de Limite é necessário lançar mão da geometria fractal e da física do caos, bem como do conceito filosófico de autopoiese (Francisco Varela, retomado por Félix Guattari em Caosmose) e ainda do poema Um lance de dados jamais abolirá o acaso, de Mallarmé. Guattari entende a autopoiese como possibilidade para a criação do novo paradigma estético da caosmose . Os seres vivos são considerados máquinas autopoéticas, pois se criam a si mesmos, se retroalimentam, em um movimento de negaentropia (Ouroboros). O universo é um sistema autopoético, que se gera a si mesmo, pela contínua criação de energia, como acontece nas supernovas e na síntese espontânea de hidrogênio (que é a pedra fundamental de toda a matéria, massa estelar que se converte em hélio pela fusão nuclear e nos outros átomos mais pesados pelas explosões das supernovas). Novo paradigma estético, a caosmose, não especificamente para a obra de arte só, ou sua crítica; um novo modo de fazer o que se convencionou chamar de ciências humanas, as sociais (meio externo), as psi (meio interno) e as da linguagem (ponte – na verdade todos os fenômenos são concomitantemente internos, externos e ponte, a língua, a mente e o socius) em uma nova e estética conjunção.

Francisco Varela caracteriza uma máquina como “o conjunto das inter-relações de seus componentes independentemente de seus próprios componentes”. A organização de uma máquina não tem, pois, nada a ver com sua materialidade. Ele distingue dois tipos de máquinas: as “alopoiéticas”, que produzem algo diferente delas mesmas, e as “autopoiéticas”, que engendram e especificam continuamente sua própria organização e seus próprios limites. Estas últimas realizam um processo incessante de substituição de seus componentes porque estão submetidas a perturbações externas que devem constantemente compensar. /…/

Parece-me, entretanto, que a autopoiese mereceria ser repensada em função de entidades evolutivas, coletivas e que mantem diversos tipos de relações de alteridades, ao invés de estarem implacavelmente encerradas nelas mesmas. Assim as instituições como as máquinas técnicas que, aparentemente, derivam da alopoiese, consideradas no quadro dos Agenciamentos maquínicos que elas constituem com os seres humanos, tornam-se autopoiéticas ipso facto. Considerar-se-á, então, a autopoiese sob o ângulo da ontogênese e da filogênese próprias a uma mecanosfera que se superpõe à biosfera.

O caos que cria o cosmos, a multiplicidade, os processos de subjetivação no lugar de um sujeito puro e duro, tudo isto e mais permitindo ao teórico pensar a ética (ciência e arte do comportamento) ligada à estética (teoria da percepção e teoria da arte). Um ato, um desejo, uma perversão; uma greve, um voto, um movimento – são manifestações poéticas e políticas, sempre.
Segundo Emil de Castro, na biografia de Mário José Breves Rodrigues Peixoto, Jogos de Armar “a certidão de nascimento desapareceu e a sua identidade foi adulterada, pois trazia o ano de 1918, quando, na verdade, ele nasceu em 25 de março de 1908; e não foi na Bélgica, como queria fazer crer, mas, quase com certeza, no Rio, talvez na Tijuca” .

Em Paris, Mário Peixoto viu, por acaso, andando na rua, na capa da 74ª edição da revista Vu, de 14 de agosto de 1929, a foto de André Kertesz (que está no site www.mariopeixoto.com), mostrando uma mulher de olhos arregalados, envolta por braços masculinos com algemas, o que o inspirou a escrever o roteiro de Limite, rascunhado naquela mesma noite, no hotel da cidade francesa. Realizado entre maio e outubro de 1930, tendo como locações arredores da cidade sul fluminense de Mangaratiba, onde também ficava a Fazenda Santa Justina, de seu tio Vitor Breves, irmão de sua mãe, que deu apoio financeiro e emprestou a fazenda e seus empregados para a realização do filme. A fazenda, que foi invadida por elementos do Movimento dos Sem Terra, pois é considerada improdutiva desde 1986 , na época das filmagens produzia café e foi o QG da produção, e só aparece numa sequência das colunas da casa sede. O filme estreou numa sessão matutitna do cinema Capitólio, em 17 de maio de 1931, e sua restauração por Plínio Sussekind Rocha e seu aluno Saulo Pereira de Mello, (pois a película estava se deteriorando) iniciou-se nos anos 50, sendo concluíada somente nos anos 70.
Ele nunca mais conseguiu filmar, mas persistiu escrevendo roteiros, na esperança de realizá-los.

Logo depois que fez Limite, iniciou o filme Onde a terra acaba, cujo título foi aproveitado por Sérgio Machado (roteiro e direção), no documentário que lhe rendeu mais de dois anos de pesquisa, sobre a vida e obra de Mário Peixoto (2002, estúdio Videofilmes, distribuição Riofilme, Brasil, 75 minutos; produção de Maurício Andrade Ramos, fotografia: Antônio Luiz Mendes, desenho de produção: Raquel Freire Zangrandi, direção de arte: Cássio Amarante e Mônica Costa, edição: Isabelle Rathery). No filme o próprio Mário dá depoimentos, além de outros cineastas e amigos, e o narrador, o ator Matheus Nachtergaele, lê trechos de diários, entrevistas e cartas de Mário Peixoto. Há ainda cenas de Limite, Onde a terra acaba, e os dois makings of. A montagem do documentário segue o ritmo de Limite, o clima do clássico, que é recuperado, pelas filmagens de céu e mar e praia da região de Angra dos Reis, bem como pela trilha sonora de músicas clássicas impressionistas francesas. Onde a terra acaba ganhou o Prêmio Especial do Júri Mostra Documentários, no Festival da Gramado, recebeu uma indicação ao Grande Prêmio Cinema Brasil, na Categoria Melhor Documentário e uma indiação ao Prêmio Adoro Cinema 2002, na Categoria Melhor Pôster. Nas falas do filme, bem como nas citações do site sobre o autor e na carta de Manuel Bandeira a Mário de Andrade, que leremos, a palavra “scenario” indica o que hoje se costuma chamar de roteiro (o texto original do “scenario” Limite foi publicado em 1996, pela editora Sette Letras).

Logo no início, as legendas:

Em 1930, com apenas 21 anos, Mário Peixoto realizou no Brasil um dos mais belos e inovadores filmes da história do cinema mudo.

Em 1998, críticos e cineastas apontaram Limite, seu primeiro filme, como a mais importante obra cinematográfica produzida no país.

Em 1992, Mário Peixoto morreu aos 84 anos, sem haver realizado um segundo filme.

A voz do narrador lê um texto de Mário Peixoto, que diz:

A realidade pra mim não tem consistência. Que se há de fazer? Não há dúvida que a vejo. Mas só. E se me refiro a ela, é num tom ou num pensamento em que a gente se refere a coisas que não constam nem impedem, porque não afetam.

A realidade pra mim não tem importância. Não me modifica. A imaginação sim. Substitui tudo, e convence. Aliás, é só o que existe pra mim. Vivo dela. Porque é verdadeiramente o que me faz vibrar. Crio e apago ao meu feitio, como um halo com um sopro.

Eu sofro de uma dor física. Mas isso não me impede que eu viva fora da realidade. Mas além do mais, ela é feia, barulhenta, desarmoniosa e nociva.

Depois, são lidos trechos do diário em inglês, que Mário escreveu quando estudava na Inglaterra, e que mostram sua inadequação, seu mal estar na Europa.

Cacá Diegues dá um depoimento, no qual declara que Limite mostra uma direção que o cinema poderia ter tomado, e não tomou. Nelson Pereira dos Santos diz que quando viu Limite o considerou o melhor filme brasileiro, e até hoje pensa assim.

Mário não se deixava filmar, fugia da publicidade e da cidade grande. Seus empregados do sítio do Morcego contam no filme que ele mentia para jornalistas e outros curiosos que iam procurá-lo, dizendo que ele não era Mário Peixoto. Seu biógrafo Emil de Castro, na entrevista citada (para Carlos Haag, Folha de São Paulo, http://www.limitude.hpg.ig.com.br/), fala que ele queria criar em torno de si uma aura de gênio, “grande mito da cultura” (ele seu filme), e não revelava ou falsificava dados da sua biografia, como no caso da certidão de nascimento falsa ou do suposto texto escrito por Einsenstein (Mário).
Ruy Solberg conseguiu produzir o único registro audiovisual sobre Mário, no curta O homem do Morcego, preto e branco, 35 mm, 20 min., realizado em 1980. É as cenas deste documentário que assistimos quando Mário fala tranquilo em Onde a terra acaba. E nos conta como teve a ideia de Limite, e como as coisas foram acontecendo, que ele e Brutus viram Braza dormida, de Mauro Humberto, e quiseram filmar algo, e Mário falou de seu manuscrito parisiense. Que procuraram Ademar Gonzaga, mas que este falou que “um cenário assim, só o seu autor poderá filmar”, o mesmo se dando com o próprio Humberto Mauro, que, no entanto, fez a ponte com eles e Edgar Brazil, o gênio da fotografia que, segundo o próprio Mário, tornou possível Limite, compreendendo as cristalinas imagens que Mário projetava em sua mente, trazendo pro Brasil o filme policromático que permitiu as nuances da película em preto e branco, e inventado e construindo equipamentos para poder fazer o filme.

Na década de 50 escreveu A Alma Segundo Salustre, roteiro para filme falado, que mostra poderosa unidade temática e estilística com Limite. Excepcionalmente, o texto foi editado pela Embrafilme, em 1983.

Em 1931, Mário Peixoto publica o livro de poemas Mundéu (reeditado em 1996 pela editora Sette Letras), para o qual Mário de Andrade escreveu no prefácio:

Os poemas, digamos legítimos, de Mário Peixoto se caracterizam especialmente pela rapidez. Tem-se a impressão de um jato violento, golfadas irreprimíveis. São poemas que nascem feitos, explosões duma unidade às vezes excelente, em que o movimento plástico das noções e das imagens é incomparável dentro da nossa poesia contemporânea.

Ainda em 1931, Mário Peixoto 1931, publica, na revista Bazar, três contos e uma peça de teatro, que fazem parte de uma coletânea editada por Saulo Pereira de Mello em 2004, Seis contos e duas peças curtas, incluindo ainda material inédito sem datação, pela editora aeroplane, a mesma casa que havia publicado, em 2002, Poemas de permeio com o mar, reunindo obras escritas entre 1930 e 1960.
Na linguagem poética de Mário Peixoto, que, se nos deixarmos prender em algumas de suas armadilhas, parece ser clara, as imagens sempre irão nos conduzir a um estado de torpor em que nosso olhar jamais estará mais claro – pelo contrário, teremos sempre a sensação de que o olhar torna-se cada vez mais turvo, por conta da confusão sensorial com que nos deparamos. O movimento das imagens se impõe, seus poemas nos ensinam, e não nos resta outra possibilidade a não ser aceitar e tentar acompanhar este movimento. Com os poemas, descobrimo-nos imersos em uma intrincada rede de imagens que, com imensa velocidade, quase sempre vertiginosa, parecem ser sempre as mesmas, ampliadas e repetidas. Saulo Pereira de Mello aponta a existência de uma imagem protéica que reaparece ao longo de Limite. Acreditamos que esta leitura evidencia a ocorrência de uma imagem essencial, que não se contenta com aparências e superfícies, assume diferentes formas e retorna com insistência, pois parece que esta imagem está sempre ao redor dos mesmos núcleos temáticos. Em função da organicidade que identificamos na obra de Mário Peixoto, podemos constatar que este fato não ocorre apenas no filme, mas também nos poemas e nos romances, com a particularidade de as imagens de cada um destes serem essencialmente as mesmas já que, apesar de as formas se distanciarem, possuem invariavelmente uma profunda coerência temática entre si. No entanto, suas imagens poéticas sempre revelam realidades que não parecem ser reais e verdadeiras, mas sim simulacros que não podem ser evitados e, por toda a obra, parece haver uma profunda coerência, pois as imagens evidenciam uma unidade temática que acaba por fornecer à sua obra a possibilidade de formar um todo orgânico – por isso referimo-nos à organicidade da obra.

Na obra literária de Mário Peixoto, a escrita jamais encobre as imagens, pelo contrário, sempre as revela. “Ao inventar a escrita, o homem se afastou ainda mais do mundo concreto quando, efetivamente, pretendia dele se aproximar”, afirma Flusser, o que nos leva a pensar que, na obra de Mário Peixoto, permanece bastante clara a percepção desta contradição da palavra escrita, que a um tempo nos aproxima e nos distancia da realidade concreta. A linguagem, em sua obra, será sempre recriada, e aparece como construção – com todos os seus riscos e promessas.

Em 1937, Manuel Bandeira pede em carta a interveção de Mário de Andrade, pois MP participou de um

/…/ concurso de cenários para filme de cujo júri você /Mário de Andrade/ faz parte. Chegou-lhe a ele a notícia de que o júri não quer levar o trabalho dele em consideração porque nas bases do concurso exigia-se um máximo de 53 páginas e ele escreveu mais de 100. O rapaz, que é um técnico em matéria de cinema, diz que não respeitou a exigência, porque o concurso era não de enredo, mas de cenário, e não é possível escrever um cenário, como isso deve ser feito e como ele aprendeu em Londres, em tão poucas páginas. O que o desola é não tanto o fato de não pegar o prêmio, mas de o seu trabalho não ser lido pelo júri: levou seis meses a trabalhar na coisa e tem grande confiança no que fez. Peço-lhe, pois, que se interesse por ele, no sentido de ver se consegue que os seus companheiros de júri leiam o que ele escreveu. /…/

/…/ O rapaz do Sono sobre a areia teve notícia que o trabalho foi afinal distribuído ao júri. /…/

Além disso, MP publicou O Inútil de Cada Um, em 1934, em edição particular pela Tipografia São Benedicto, e em 1935, pela editora Alfredo Frederico Schmidt. O romance foi recolhido à época, e relançado em 1996, pela editora Sette Letras, na versão original.

Mário reescreveu o texto, que havia sido sabotado, censurado, romance original de 1935 nunca esteve no mercado livreiro, pois toda edição foi adquirida e queimada pelo pai do autor. Entre 1967, em Angra dos Reis e no Sítio do Morcego, e 1975, quando se instala no hotel Angra Tourismo, Mário reelbora a obra, agora com seis volumes.

Este relançamento seria a coroação de seu trabalho criador, tantas vezes e de tantos modos abortado; não era mais o volume único original, e sim a retomada de toda sua vida e de tantos projetos, um balanço, um legado, uma espécie nova mas que nos traz à memória À la Recherche du Temps Perdu, de Proust. 1984.

A obra se estende por seis volume: 1 – Itamar, 2 – Lins, 3 – Cádio, 4 – Hernani, 5 – Sonâmbulas Gelatinas num Aquário e 6 – O Esgrima das Profundezas.

A editora Record publicou o primeiro em 1984, por intervenção de Jorge Amado, com quem Mário havia trabalhado anteriormente num de seus projetos fílmicos. Os outros cinco volumes estão sendo preparados para edição pelo Arquivo Mário Peixoto (fundado por Walter Salles em 1996, o arquivo é gerenciado por Ayla e Saulo Pereira de Mello, abrange, entre outros, um imenso volume de livros, roteiros, correspondências, fitas de áudio e vídeo bem como material fotográfico e é aberto a pesquisadores, estudantes ou qualquer pessoa interessada em conhecer a vida e obra de Mário; o endereço é Praça Nossa Sra. Da Glória, 46, Glória, Rio de Janeiro, RJ, CEP: 22211-110).

Em “A Obra-mestra de Mário Peixoto”, apresentação da edição de 1984, Octavio de Faria diz:

Pensando bem – e sem um minuto de vacilação – quero afirmar bem alto: de todos os romances que foram escritos no Brasil, e desde o início dos inícios, nenhum deles assume a importância, o valor intrínseco de O Inútil de Cada Um, de Mário Peixoto.

Mário Peixoto, o de Limite, todos conhecem. Mesmo não figurando nos nossos dicionários, bibliográficos ou artísticos, ele é o inconfundível criador de Limite – a obra de cinema puro que entusiasmou cineastas como Einsenstein, Poudovkine, Orson Welles – o poeta de Mundéu que deliciou com seus ritmos próprios tanto Manuel Bandeira como Mário de Andrade, o poeta que tem pronto para impressão Poemas de Permeio com o Mar, que reputo uma das obras máximas da nossa poesia contemporânea.

Mário filmou Limite aos vinte e um anos. No entanto, era já a obra de sua vida, que o marcaria para sempre com o estigma de gênio e de maldito, de hermético, aquele de quem não se fala, o autor do filmes que não se vê e não se entende.

Talvez tenha sido ele, tão jovem, aquele que no Brasil de sua época melhor entendeu e desenvolveu a proposta revolucionária radical que Mallarmé apresentou como novo paradigma estético no poema.
E de que forma é a proposta de Mallarmé retomada em Limite?

Já dissemos que há obras que são vasos comunicantes (se você colocar uma substância em apenas um dos vasos comunicantes, daqui a pouco os dois a terão por igual), para além da simples influência, como é entendida normalmente; em uma abordagem relativística (ou, por outro lado, quântica) do tempo ele foge em muitos sentidos ao que a experiência comum capta e entende, aparecendo como não linear, e avançando em ondas de radiação em várias direções, inclusive do passado, como na do futuro (que são duas das muitas possíveis, e que nós conhecemos).

Assim podemos pensar não só na influência de Mallarmé sobre Joyce ou Peixoto, mas também na dupla direção da troca, tráfego ou tráfico de ideias, ritmos, pensamentos, versos, durações etc., viajando de uma a outra, entendendo sob a luz da física quântica e da cibernética e da informática a questão da intertextualidade (ou transtextualidade).

Há muito de cinema profetizado já no poema de Mallarmé. Muito provavelmente ele é também uma sinfonia; mas talvez seja, pelas mesmas razões, muito mais ainda um filme invisível, ou visível na virtualidade; sua preocupação com a duração é cinematográfica; sua reprodução do pensamento se fazendo como ondas em movimentos aquáticos e marinhos é cinematótica.

Limite é cinema, é claro – cristalino, pura luz, pura visão, quase que ultrapassa o estatuto de visibilidade. Nas duas obras a mesma investigação; o limite e o ilimitado, e o humano no meio, limitado por todos os lados, de todas as maneiras, e no entanto trazendo o ilimitado no sonho, na percepção, no desejo e no pensamento.

É interessante que uma revista de vulgarização científica fantástica (na trilha de O Despertar dos Mágicos de Louis Pauwels e Jacques Bergier e O Tao da Física de Fritjof Capra) chame-se Limite, e tenha na capa do primeiro número, que saiu em 1993, a ilustração de uma caravela navegando pelo espaço entre a Terra e seu satélite. Em matéria publicada no número dois, “Natureza Artificial”, que está na seção denominada “Caos” (referência à ciência do Caos e ao livro Caos; a Criação de Uma Nova Ciência, de James Gleick, que também trata do assunto em “Uma Geometria da Natureza”) Rafael Monroe assim explica a geometria fractal:

Existe um tipo de objeto de artesanato vendido em barraquinhas de esquina que sempre desperta a curiosidade dos observadores. São duas placas de vidro seladas em formato de sanduíche, tendo como recheio uma fina camada contendo água e areia colorida. Para exibi-la o camelô sacode fortemente o conjunto e a água se turva completamente. Colocando então o objeto em repouso, a areia vai assentando e – surpresa – paisagens começam a se formar no quadro. Vemos montes, cordilheiras, vales, planícies… um pequeno mundo vai surgindo, uma cena nova a cada sacudida.

/…/
Benoit Mandelbrot, um gênio matemático de intuição admirável, começou a demonstrar há duas décadas que as formas naturais são criadas a partir de sistemas de equações extraordinariamente simples. Ele provou que repetindo estas formulações de forma interativa por milhares de vezes, era possível criar formas que simulavam as produzidas pela natureza.
Na publicação da primeira versão de suas ideias, em 1975, ele reuniu trabalhos esquecidos de matemáticos do passado à sua nova visão da gênese das formas naturais e criou a assim chamada Geometria dos fractais.

As figuras fractais têm a propriedade de produzir formas similares em qualquer escala. Poucos grãos de areia em um vidro mostram figuras que parecem muito as de cadeias de montanhas reais. A água de uma onda deixa na areia uma forma que lembra a de um litoral completo visto do alto de um morro. /…/

O filme Limite é um ótimo exemplo, em arte, das teorias da física quântica e da geometria dos fractais. Ali o mar é o fundo de todos os ritmos e durações que ocorrem, como se, de maneira fractal, todo o movimento vital ou social das três pessoas no barco já tivesse a forma do movimento marítimo, como se toda sua vida fosse a preparação do momento em que, náufragos no pequeno bote à deriva, os três se encontram, ali presos, limitados pelo barco e pelo mar, sem ter para onde ou como ir.

Saulo Pereira de Mello, que trabalhou na recuperação do filme, praticamente destruído, preparou um livro em que reúne os fotogramas em sequência, e na proporção da duração dos takes, que é um valioso estudo do ritmo e montagem da película e da excepcional fotografia de Edgar Brazil. Saulo, pressentindo que o filme é uma cartografia de intensidades que trabalha com o tempo complexo, complicado, não linear, fez questão de deixar bem claro que o livro é um MAPA de Limite, não um roteiro, nem uma partitura, ou uma amostragem de fotogramas, e sim um MAPA, como se guardasse as coordenadas de um tesouro, ou de um local a que se pretende chegar.

Leiamos algumas observações extraídas o prefácio e da introdução:

Constantemente, a cena que se está vendo (absorto por ela) domina o desenvolvimento que ante nós se está desenrolando. Usando a terminologia de Bergson, poder-se-ia dizer que, a cada momento, o “devenir” do filme é rompido em sua continuidade, homogênea e perfeita, pelo “momento” artístico que quer parar e se fixar numa obra de arte autônoma. A cada instante, a cena tende a se tornar fim em si, de tal modo o realizador conhece e admira o seu valor estético como parte, como unidade indecomponível.

/…/
Em torno de uma linha central, eixo de todo o filme, vejo inúmeros círculos, curvas que se repetem (mas que não se acentuam muito) respondendo umas às outras numa harmonia quase matemática. Tudo equilibrado, como que desenhado a compasso.

Esse eixo central não me parece ser, como se pode pensar à primeira vista, o barco em si, (o barco onde começa e acaba o filme e onde se reúnem os destinos separados de seus personagens). Parece-me, antes, residir no ritmo do barco (se a afirmação não parecer ser demais estranha… e vou tentar explicá-la).
Quando os personagens narram a vida que tiveram, ou ela nos é contada, sente-se, graças à rigorosa unidade de ritmo do filme, que o ritmo do barco foi como que transportado para a terra e continua presente em todas as eventuras que descreve.
/…/

Utilizar “Limite” como acesso às próprias raízes de obsessões do Ocidente é cumprir o destino para o qual, em última análise, foi gerado por sua cultura-útero. A sua visão é uma espécie de aventura profundamente humana, essencialmente fáustica, viva e sempre pessoal – embora comum a todos os homens ocidentais, com os sentidos alerta e ligados pela mesma obsessão do infinito. É uma viagem – viagem a uma terra incógnita onde existe um tesouro: a própria compreensão da natureza do Ocidente. Por isso este trabalho é um MAPA, uma carta planetária que, conscientemente vista, decifrada em seus símbolos, revelará o destino que conduz “Limite”.

A fita começa com o letreiro Limite, com as letras se ampliando e distorcendo, como cera que derrete. Depois os créditos; fade out; negro; fade in: sol sobre monte com aves marinhas; fusão (sobreposição desta imagem a) Olga (mulher 1) com algemas, mãos com algemas só, fusão, close dos olhos, fusão, brilho do sol dançando na água do mar, fusão, olhos, fusão, close de Olga no barco. Três pessoas, num barco a remo, perdido no oceano: homem 1 (Raul Schnoor), mulher 1 (Olga Breno) e mulher 2 (Taciana Rei). Raul abatido, caído prà frente. Calmaria. Desânimo.

O mar, os remos inúteis, seus cabelos desgrenhados. E a repetição e a permanência disto tudo. Flash back: Olga presa, um homem de quem só se veem as mãos e os pés a ajuda a fugir. Grades vazias. Toda a cena da fuga é mostrada com os pés, os braços, objetos parciais. Novos ângulos, inusitados; o casario, árvores, ramagem (como a estrutura vegetal que volta e meia surge fotografada e pintada em Signantia Quasi Coelum). Em sua peregrinação de fugitiva o mesmo desconsolo que ela irá mostrar depois, no barco em alto mar. O mesmo sem saída. Olga costurando, closes dos utensílios de costura, estranhamento da roda da máquina, do carretel de linha etc., pela excessiva proximidade. A notícia de sua fuga, no jornal que ela lê. Casas, rua, roda de trem girando (como a roda da máquina de costura). Volta ao barco, à exaustão e ao desespero. Toda uma sequência de negativos danificada, que culmina em um trecho totalmente perdido: os estragos nos celulóide parecem fogo vivo, e ao mesmo tempo devir molecular, moléculas dançando como a água e o barco e quem nele está. Um intromissão quântica, ao acaso, e que fica estranhamente em harmonia com o movimento do filme.
Não vamos acompanhar cena a cena, pois, além do filme estar hoje restaurado, há o mapa organizado por Saulo; e “contar’ as imagens, além de não poder reproduzir a sensação única de vê-las em sua música e luz, diminui e cerceia o sentido. Fazemos apenas algumas anotações que podem ser sintomáticas, como no take 93, um garoto (de quem só se veem o peito, os braços e as pernas) avança para a câmera carregando um peixe na mão, pendurado pelo rabo. Logo depois, takes 95 e 96, cesta de peixes, de onde um é retirado.

No take 91 tínhamos visto uma guerra pulsante, sobre a areia. O limite, para o animal aquático na terra, para o homem no mar. A partir do take 98; o zoom no buraco que escorre água, uma espécie de bica, incrustada em uma coluna – mais um cruzamento de imagens inorgânico orgânico. O mesmo zoom se faz nove vezes, intercalado com outras imagens, como a do casario visto deitado, telhado, câmera corre sobre telhado. O ritmo frenético das tempestades e dos processos orgânicos nas pedras, nas telhas, nos ferros etc.

Depois vem a vez de Taciana. Homem bêbado na escada, olhares para alianças. Ela anda pela rua, encontra com outro homem, a câmera fica ao nível do chão, entre os dois, que parecem gigantes enquanto falam, ao alto o céu, o infinito entre eles. Taciana sobre uma pedra olha o mar. Câmera avança para ela: desespero. Como no barco, Taciana já parece que pensa em se afogar. Olga já está presa na cadeia ou a um trabalho sem sentido, e à condição de fugitiva. Cada um com prisões e limites sem fim, enquanto o tempo todo o olho desliza pelo infinito na praia, no mar, no céu, na arquitetura, na folhagem. Brutus anda pela rua, entra em um cinema, toca piano, enquanto na tela é projetada a película “Carlitos Encrencou a Zona”, com Charles Chaplin – um fugitivo (Carlitos) com uniforme de zebra, que cavou um buraco na terra para sair ao lado do guarda, tenta voltar pelo buraco; guarda o vê e tenta pegar, Carlitos negaceia o corpo, guarda cai. A prisão, a inutilidade da fuga, mesmo no filme dentro do filme, mesmo na comédia. Closes de bocas sem rostos que gargalham, contraponto do rosto de Edgar Brazil, fotógrafo de Limite, dormindo com um palito enfiado na boca.

Volta ao barco, desespero, vãs tentativas, não há nada a fazer. Olga tenta remar, desiste. Deita-se à borda do barco, bota as mãos na água. Mãos e pés, casal sem rosto anda pela praia, de mãos dadas. Pegadas. Casal ao longe, no capinzal. Vegetais, postes com fios de luz. Arcada de ruína, cacto sobre areia. Raul no barco, em desespero, fala. Vê que a água já toma o fundo do barco. Vegetais e postes, em positivo e em negativo da foto. Ruína da arcada. Mar. Homem (mãos, tronco, pernas) que deixa casa de mulher, beija-lhe a mão. Vegetação, passos. O homem, que já aparecera ao beijar a mão da mulher e é Raul, fumando, entra em um cemitério. Encontra Mário Peixoto sentado triste sobre um túmulo, a mão segurando uma aliança. Os dois se defrontam em cena expressionista, o excelente ator Mário diz a Raul (são as únicas três legendas de todo o filme, duplamente mudo para falar mais):

Você vem da casa da mulher que não é sua
supondo que ella seja minha como ésta foi sua
e se seu lhe disser que élla é morphética?…

Olhar terrível de Mário, fusão para o barco, a impotência, o tempo de espera. Volta flash back, Mário sai apressado do cemitério e Raul vai atrás dele, gritando pela mata, pergunta por ele para as pessoas. Câmera nervosa, panorâmicas rápidas, chicotes sobre a mata. Raul grita, e grita, e grita. Muitas vezes. Corre. Grita. Pergunta a mulher e a pescador. Continua andando. Até cair no chão, exausto, junto a uma cerca de arame farpado. Mar. Mata. Mão no chão. Duas cruzes. Redes, barcos, cabanas de pescadores. Cruz.

Raul compra passagem de trem. Close da engrenagem da roda do trem: parada, inicia movimento. Barco. Vazio. A lata de biscoito vazia. Raul vai pular ao mar, Taciana tenta impedi-lo, falam. Taciana o solta. Raul se joga. Taciana fica olhando da borda, os reflexos da água cintilam no seu rosto em close, take símbolo do filme. Raul não volta. Entra água no barco. Olga sempre sentada na proa, como uma esfinge, de costas para o barco e para Taciana, que a sacode; sendo repelida por Olga, Taciana cai no fundo do barco, prostrada, e Olga chora em desepero.

Tempestade no mar, num longo take, todo de movimentos de ondas e vetores de intensidade. Acabada a tempestade, encontramos Olga agarrada a um destroço, boiando no mar, os cabelos encharcados de água e sal, “Olga como uma alga”, ela mesma com algemas contra fundo negro, e agarrada a destroço boiando, brilhos, cintilações do mar, píncaro, a mesma imagem do início do filme, pássaros pousam no monte, céu vazio, píncaro vazio, fade out, negro.

O espectador sai transformado, em outro tempo, outra velocidade, rompidos seus limites, pelo menos por uns instantes.

A ilha do sonho, do delírio, do desejo e do naufrágio, ilha no ar, fantasma, em outra dimensão, é o cenário do filme de papel A Alma Segundo Salustre, que é assim apresentado por Arnaldo Jabor em “Nossa Fome Eterna”:

/…/ A Alma, Segundo Salustre é nosso sonho impossível. É a suprema saudade do amor que nunca tivemos, é a mulher impossível, é o mundo que se nos nega, é o pranto por tudo perdido, a metáfora ser palpável, é o desejo infinito e sagrado de que o mundo existisse, a esperança soluçante de salvar um universo platônico. Mário é um poeta que não se contenta com a metáfora, quer mais, mais, mais longe, quer filmar a essência, filmar o ar, e consegue; por isto, o filme fica em estado de roteiro, que é quando a câmera não surgiu ainda com seus ruídos e limites e o roteiro é a metáfora da metáfora, o plano de trabalho, a antecena, a esperança da imagem, a luz sem forma. A forma limita. /…/

É a história de uma aprendizagem radical, total. César é o homem que vai aprender: a não falar, a ouvir a música e viajar, a ver, mais do que ouvir. Maduro, reencontra em sua ilha fantástica a infância de nada saber, de estar totalmente deslocado. Divide-se em dezenas de pessoas, como ossos seus que criassem vida, todos sem a falange do indicador da mão direita. Reencontra a sereia, a Mãe do Ouro, que não afoga seus amantes, mas tira-lhes a virgindade, tornando-os homens, e juntamente com isso tirando-lhes a força também, fazendo deles seus escravos, para o resto da vida . A borboleta que se debate contra a vidraça, forçando, querendo ultrapassar os seus limites; as borboletas espetadas na coleção e as que voam às centenas, ao redor de seu barco falam da transmutação, da evolução, da possibilidade do ser vivo de ultrapassar os limites do conhecido, o vidro que prende mesmo que pareça que não está lá.

Quando César morre sua mão se completa da falange do indicador que lhe faltava, ao reabsorver todas as outras personalidades que dele saíram, completos agora. E uma onda congelada, o cinema que não traz mais o movimento, desde o início dos tempos: e a mão completa aponta para a onda, e ela explode, arrebenta na praia, funda a existência .

Em O Inútil de Cada Um, o anagrama, ou quase; limite – inútil. O fantasma da inutilidade ronda os personagens, que vivem suas vidas tão cheias e tão vazias, sem porquê.

A realidade para mim não tem consistência; o que é que se há de fazer…?! Eu constato e tal, mas absolutamente não tomo parte… É como se não fosse… Não há dúvida que eu a vejo, mas só. E se me refiro a ela – mas aquilo não me penetra – é num tom ou num pensamento em que a gente se refere às coisas que não constam nem impedem, porque não afetam.

O capítulo cinco de Itamar, chamado “Hibernação”, conta a descida a um mundo passado (como em Igitur), uma outra dimensão, um castelo em ruína, cheio de monstros e fantasmas, morcegos, cobras e teias de aranha, onde o personagem vai buscar o livro, que se desconfia que seja este mesmo livro que se está lendo , que é como uma penetração, sucessivas camadas da substância do tempo, como quem cava, camada após camada, cidades soterradas, memórias celulares e moleculares (e atômicos e subatômicas e…):

/…/ Mas o que eu quero salientar é visto de outro ângulo – onde o tempo propriamente assiste mas não penetra – se isso é possível.

Escrever é um transe, um processo, que, tal como o seu filme, que nos força a mudar para outra velocidade mais rápida, e mais intensa, envolve o leitor no processo, do qual não sai ileso:
/…/ Escrevo por compulsão ou transe – e se com a insatisfação começar a correr muito, acabo por deteriorar o esquema – isto é quase sempre infalível!

O mistério e a máquina estão principalmente no recurso dos travessões, que fragmenta a obra inteira, estilhaçando as frases, redobrando os sentidos e fazendo brotar ideias dentro das ideias.
/…/ Esquecera aquilo tudo e agora me vinha à mente. Justo ali – e por quê – o que tinha a ver aquilo tudo com Lia – com as ruínas – e, sobremodo, revivendo tão nitidamente numa hora como aquela – naquele local sem ligação – veemente e dorido, invadindo-se com aquelas recordações soterradas, parecendo, além do mais, coisas de há séculos?

Mallarmé, do coração do romantismo e do simbolismo envia como um farol um facho de luz que ainda serve como guia para os barcos dos poetas-marinheiros, não para a chegada ao porto, medíocre aspiração ulissiana, mas para o devir-Homero, no dizer de Blanchot, o encontro mais íntimo e amoroso com o mar, o naufrágio e o canto da sereia.

Um lance, entre um número absolutamente incontável de outros, tantos quantos grãos de areia há na praia, quantas estrelas lá no céu, um único lance, entre os muitos que pode o indivíduo, com os dados à disposição, fazer, fica sendo a sua jogada, neste caso, um lance de dados aparentemente (para críticos e público unilaterais) fracassado, torna-se vitorioso na medida em que inventa novos jogos, novas formas de fazer, novas mentalidades, ergo, novos mundos, novos egos e até, quem sabe, está inventando uma nova arte, que poderíamos chamar de nada, isto é, caos, ou, ainda, para não confundir o plano de imanência com os sistemas, caosmose, o limite fluido e translúcido, geleia, entre o real e as virtualidades.

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