Entrevista com Luiz Carlos Maciel – parte 2
LCMJ: Que não tem medo de queimar o filme, porque já tá com o filme queimado.
LCM: Tem fama de maluco mesmo.
Cláudio Carvalho: Eu me lembro que na época lá nos EUA conseguiram promover um debate do Krishnamurti com físicos.
LCM: Pro físico é mais fácil que pro filósofo, porque o físico com esse negócio dos quanta, eles fundiram a cabeça, e aceitam melhor. Mas o filósofo assim, o filósofo de universidade, não admite. O próprio Carlos Henrique Escobar foi lá pra participar do evento, mas a sua primeira declaração foi a seguinte: não há nada pensando no Oriente, que não tenha sido pensado, antes e melhor, na filosofia ocidental. Quer dizer então que todo o pensamento oriental é desnecessário.
CC: Mas a própria origem do discurso filosófico, aquela coisa do milagre grego, a filosofia seria uma coisa que nasceu na Grécia, isso já é uma espécie de etnocentrismo.
LCM: Isso, academicamente, pra você ser rigoroso, você não pode chamar o pensamento oriental de filosofia. Eu falei pensamento oriental, não falei filosofia oriental, porque a filosofia é ocidental.
LCMJ: Porque a filosofia é uma produção totalmente racional, e o oriental trabalha com imagem.
D: Que é uma patente, é grego, ninguém mais pensa, só ele pensa.
LCM: A filosofia é uma coisa inventada pelos gregos.
LCMJ: Você olha os Vedas, olha os textos da China, não tem conceitos ali. Você tem insights sobre o mundo, figuras, imagens sobre o mundo, que é pensamento sobre o mundo.
LCM: Mas não é nada filosófico, é totalmente poético. Mas os Upanishads são especulativos, há um pensamento especulativo no Oriente, não como o da filosofia, mas há um pensamento especulativo também, principalmente na Índia.
CC: Antes de falar de religião, como a gente começou falando de contracultura, eu queria levantar aquele tema, como você falou sobre nos marxistas, que na época a contracultura foi muito criticada pela esquerda tradicional, a contracultura não teria lugar no Brasil. Seria uma importação alienígena, por exemplo, ela nasce nas universidades norte-americanas, de uma rebeldia contra o saber institucional acadêmico.
LCM: Ela é feita pelos estudantes.
CC: Naquele momento no Brasil nem um por cento da população era universitária, hoje são cerca de dez por cento. Eu queria saber a sua posição, o que você acha. Houve contracultura no Brasil? Foi um mero produto alienígena? Foi mais uma “ideia fora do lugar”? Ou você acha que ela encontrou lugar?
LCM: A contracultura é um produto alienígena importado pelo Brasil como quase toda a cultura. Toda a cultura brasileira foi um produto alienígena importado pelo Brasil. A cultura brasileira feita aqui é a cultura indígena, o resto veio da Europa.
CC: Inclusive nós estamos fazendo essa entrevista em português.
LCM: A cultura branca veio da Europa, a cultura negra veio da África. E o indígena que é daqui, o resto tudo veio. A contracultura na verdade foi um negócio que nos EUA teve mais poder, mas foi uma coisa que tava no ar assim em todo o Ocidente. Na Europa também, na Inglaterra, na França.
D: Mas você considera que no Brasil ela tem o mesmo perfil? Quer dizer, ela se inscreve inicialmente como uma tentativa de oposição a um padrão, ou sob esse rótulo, várias outras coisas, características, típicas do Brasil começam a…
LCM: Olha, força da contracultura nos EUA se deve ao protesto contra a guerra do Vietnã. Foi o que deu essa força. Antes havia uma rebelião lá que vinha dos beatniks, da beat generation, mas até a beat generation era uma coisa de escritores, poetas…
CC: Não era um movimento social, ficou restrito a uma intelectualidade. E no Brasil, ela teve esse perfil?
LCM: Não entrava nisso, só nos EUA. Os bem comportados entraram quando veio o movimento hippie, por causa do Vietnã, que não queriam ir prà guerra, começaram a rasgar os certificados militares, e portanto se tornar marginais.
LCMJ: A impressão que me dá é que a partir desse problema, dessa situação, surge uma proposta de uma nova forma de relação social e de uma nova consciência.
LCM: No Brasil aconteceu a mesma coisa, só que não foi o Vietnã, foi a ditadura militar. O único lugar onde houve um protesto mais sofisticado sem uma motivação tão violenta quanto o Vietnã ou a ditadura militar foi na Europa, na França por exemplo.
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