Entrevista com Luis Carlos para Clara Câmara, para o Jornal da Paraíba

1) Como surgiu a ideia de escrever esse raio x do samba brasileiro?

Eu desenvolvo um projeto literário e filosófico que se desdobra por vários livros de ficção e ensaio. No campo teórico, a minha mesma pesquisa é sobre uma nova consciência, e o quanto os pensamentos das margens, principalmente da América e do Brasil, contribuem para a sua construção. Escrevi sobre antropofagia em O Olho do Ciclope, sobre Caetano Veloso em Crisólogo, Jorge Mautner em Proteu, Noel Rosa em O Estudante do Coração e Carlos Castaneda em A Fresta entre os mundos. Meu estudo sobre o samba é na verdade sobre o desenvolvimento da MPB no século XX, entendendo que o samba é um megagênero que abarca vários outros gêneros e ajuda-os a se formatarem, dando o tom do que é a música popular brasileira, desde o inicio do século XX. É por isso que escrevo sobre o samba, para falar do pensamento brasileiro, negro, índio, português e mestiço, que no Brasil se expressa tanto por música, e com tanta qualidade e força.

2) O livro foi resultado de quanto tempo de pesquisa?

O livro é resultado de uma pesquisa que faço desde que tenho uns seis anos de idade, mas não vou dizer quanto tempo dá isso. Propriamente, esta redação, começou logo depois que defendi o Doutorado, como uma de suas continuações, as outras enumero acima, quer dizer, desde 1997.

3) Como foi feito o processo de reunião das informações?

Meu pai tinha centenas de LPs antigos e ouvia todos eles, todo final de semana, bem alto, e eu adorava isso. Depois veio a mpb mais nova pra mim, na minha vida, e o rock e o pop, e a música clássica. Tudo isso se liga, no meu livro, e no mundo. Minha pesquisa neste livro inclui ouvir milhares de LPs, inclusive 78rpm, cds, dvds, filmes, shows. E a leitura de livros sobre música popular brasileira, bem como artigos e sites. Mas, o mais importante, tudo que eu falo é a minha forma de pensar, a minha visão, ou melhor, a minha audição do mundo musical.

4) O Sr. faz muito o exercício de comparar o samba atual com o samba “de antigamente”? quais seriam os resultados dessa reflexão? como o sr. avalia o que é produzido hoje no samba brasileiro?

Bem, o cenário é mais complexo, não temos só o antigamente e o atualmente. Temos uma riqueza enorme de coisas antigas, das quais pego algumas, as mais importantes pra mim no momento, porque são as que gosto mais, e as que se desenvolveram em quem veio depois. Antigamente, antes da Bossa Nova, havia muita porcaria, mas havia gênios como Noel Rosa e Braguinha, e cantores fenomenais, como Orlando Silva e Silvio Caldas. Hoje, há muita porcaria, como havia antes, sempre vai haver enquanto as pessoas forem tão abandonadas culturalmente, mas temos grandes gênios, como Arrigo Barnabé e Itamar, e compositores maravilhosos, como Max de Castro e BNegão, assim como grandes cantores e cantoras, Marisa Monte, Diogo Nogueira, Marcos Sacramento etc. Não considero o samba uma coisa fechada ou parada, tudo isso que eu falei pra mim é samba.

PS:
Clara Câmara possui uma qualidade rara numa repórter, aliás três qualidades:

1) ela realmente leu meu livro, com abertura para entendê-lo, e o entendeu, o que, em si, já é muito;
2) ela ouve o que o entrevistado fala, por isso pode reportar o que ele realmente que dizer (porque ela lê e ouve, as qualidades são cumulativas);
3) ela respeita o sentido do que você falou e transmite isso aos seus leitores, com fidelidade e respeito.
Clara, essa atenção é antes de tudo saber amar e respeitar os seus leitores, e, claro, a sua vocação.

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