De Noel a Joel – parte 5

E há ainda suas “operetas”, que ele fez para Rádio Clube do Brasil, a pedido do Almirante, que as chamava de “revistas radiofônicas”. O ladrão de galinha e O barbeiro de Niterói foram ao ar em 1935; nos dois casos, as canções são paródias que Noel fez de outros autores e de si mesmo (impagáveis, como suas “Cordiais saudações” na versão feita para O barbeiro de Niteroi). Em suas operetas Noel demonstra que poderia ter se desenvolvido como um grande autor teatral, seguindo seu estilo de misturar o humor mais inteligente, a preocupação satírica com as coisas mais comezinhas do cotidiano e uma profunda visão filosófica do mundo. Tem um humor teatral que nos faz lembrar das comédias de Martins Pena.

A noiva do condutor não foi apresentada na época, e só foi gravada em 1986 com Marília Pera, no papel de Helena, a noiva, Grande Otelo, como Doutor Enrique, o pai da noiva, e Oscar Bolão, que faz Jota Barbosa, o pai do noivo. Carlos Didier dirige a produção, toca violão e vive Joaquim, o condutor. Junto com Bolão, participou do Conjunto Coisas Nossas, que fez a instrumentação do CD.
Carlos Didier também é coautor, junto com João Máximo, do mais cotado livro Noel Rosa: uma biografia, editado pela Universidade de Brasília em 1990.

As músicas são, duas de Noel, que ele retomou, naquela trip sua de paródia de si mesmo, “Cansei de pedir” (adapta a letra, e vira “Cansei de implorar”) e a contundente “Tipo zero”. As outras oito são um prelúdio só do maestro húngaro Arnold Glückman (seu sobrenome significa “homem feliz”), e sete canções inéditas, com letras preciosas de Noel e melodias riquíssimas de Arnold Glückman, no estilo das operetas vienenses: “Tudo pelo teu amor” (mesmo tema do prelúdio e do finaleto), “Boas tenções”, “Para o bem de todos”, “Joaquim é condutor”, “Perdoa este pecador”, “Tudo nos une” e “A noiva do condutor – Finaleto”. Neste tema de “Tudo pelo teu amor”, Glückman faz um samba canção, visão antropofágica deste maestro húngaro com formação vienense radicado no Brasil, trabalhando em rádio e compondo este sublime samba com Noel Rosa, o grande, o gigantesco Noel!

A reforma das calçadas de Vila Isabel deu origem ao livro de pedras portuguesas, no “chão de estrelas” do bairro, a antologia da MPB por Almirante:
Já no século XX, o bairro (Vila Isabel) ganhou uma fama de vida boêmia e foi o lar dos compositores Noel Rosa, Orestes Barbosa, João de Barro (Braguinha), Almirante e muitos outros. “A Vila de Noel significava para o Rio de Janeiro, o que Ipanema representou na década de 60”, como afirmou o jornalista e historiador Sérgio Cabral, pai do atual governador do estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho – (2007).

Em 1965, nas comemorações do IV Centenário da Cidade do Rio de Janeiro, o arquiteto Orlando Magdalena teve a idéia de decorar as calçadas do Boulevard 28 de Setembro com mosaicos portugueses desenhando partituras de músicas de grandes compositores da Música Popular Brasileira, o que foi aprovado pelo então governador do Estado da Guanabara, Francisco Negrão de Lima (1965-1971). A idéia foi levada ao músico Almirante que escolheu as músicas que deveriam compor as calçadas.

Foram assim construídas, desde a Praça Maracanã, no início do Boulevard 28 de Setembro, até à Praça Barão de Drummond, as famosas calçadas musicais de Vila Isabel, com as partituras das seguintes músicas:
• Cidade Maravilhosa – André Filho (esta primeira ainda na Praça Maracanã)
• Abre Alas – Chiquinha Gonzaga
• Pelo Telefone – Donga/Mauro de Almeida
• Mal-me-quer – Cristóvão de Alencar/Armando Reis/Newton Teixeira
• Feitiço da Vila – Noel Rosa/Vadico – em frente a Associação Atlética Vila Isabel
• Ave Maria – Ertildes Campos/Jonas Neves
• Aquarela do Brasil – Ary Barroso
• Jura – Sinhô
• Carinhoso – Pixinguinha/João de Barro
• Linda Flor – Henrique Vogeler/Luís Peixoto
• A Conquista do Ar – Eduardo das Neves
• Luar do Sertão – Catulo da Paixão Cearense/João Pernambuco
• Chão de Estrelas – Orestes Barbosa/Sílvio Caldas
• Linda Morena – Lamartine Babo
• A Voz do Violão – Francisco Alves/Horácio Campos
• Na Pavuna – Homero Dornellas/Almirante
• Primavera no Rio – de João de Barro
• Apanhei-te Cavaquinho – Ernesto Nazareth
• Florisbela – Nássara/Frazão

Já no século XXI, quando de uma reforma da Praça Barão Drummond, às dezenove canções foi acrescentado, na calçada da praça, o samba “Renascer das cinzas”, de Martinho da Vila, numa justa homenagem.

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