A filosofia – parte 4
Pensar o pensamento é criar, porque o pensamento é sempre novo, na medida em que refazermos uma trilha é fazer uma trilha nova sob nosso pés, é olhar um novo cenário, percorrer um novo caminho, cada um o seu.
A Filosofia é o metapensamento.
A teoria não deve ser como um rocambole, que coloca camada sobre camada enrolada, ou mesmo um pavê, e sim como artesanato de um cinto feito de três fios coloridos, cada um com uma cor.
Toda a teoria das fontes que você bebeu, todos os teóricos e pensadores e cientistas e filósofos, ligados direta ou indiretamente, ou não ligados à sua área teórica, podem ser usados, se lhe interessarem, se fizerem você vibrar. Mas a citação explícita ou implícita deles deve o tempo todo se misturar com exemplos e fatos tirados do corpus, do seu objeto de estudo, ou de pensamento. E ainda, você deve falar também, deve pensar independentemente, se bem que ligado a tudo que é dito pelos teóricos e mostrado no corpus.
A questão me parece que não é saber escrever ou não, e sim uma proposta, uma hipótese, e também a estruturação dessa hipótese ou proposta de interpretação da realidade. Ora, a estrutura da hipótese só pode aparecer quando você tiver a hipótese.
Muitas vezes, o que falta não é criatividade, mas coragem, soltura, de jogar a sua criatividade pessoal sobre os dados com os quais você está trabalhando. Estes, os dados, tanto vêm dos livros como das observações, que são fundamentais, por exemplo, na psicologia. Cada autor que fez um livro o fez num momento e num contexto. É por isso que as ciências sempre caminham, porque a realidade é mutável. E as ciências humanas são particulares, porque as realidades psicológicas e sociais não são universalizáveis.
É muito importante que você faça a imbricação e a mesclagem entre o que lê e a realidade, a partir daí você vai começar a pensar coisas, ter ideias, que meio que deformam o que leu, porque a teoria passa pelo meio difuso da aplicabilidade. Aí você pode começar a desenvolver uma hipótese. Por exemplo, meios eletrônicos de comunicação de massa podem estar afetando a maturação cognitiva e emocional do adolescente. Podem tanto estar gerando uma maturação precipitada, antes do tempo, quanto fragilizando essa maturação. Não estou dizendo que seja isso, mas essa poderia ser uma hipótese de trabalho. De posse dela você começa a JOGAR, a brincar, e a brigar com os textos que leu, e colocar esses textos pra brigar entre si, e com a realidade.
Veja bem, todo estudo enquanto estudo de um referente, seja ele de que nível ou dimensão for, é uma ciência, no sentido lato. Se ele se incorpora institucionalmente a um dos muitos ramos das ciências atuais, devendo com isso utilizar o método científico, torna-se ciência no sentido estrito.
Mas a teoria não é um estudo meramente, quer dizer, produz saber e ciência, mas não é uma ciência, e sim um pensamento, que tem a soltura por exemplo de não precisar comprovar com dados numéricos ou quejandos o que propõe.
Seria o último reduto da filosofia, que, por outra lado, se torna sua ladra, a teoria sem outro nome vindo para ocupar o seu lugar, quando questão por questão foi se independentizando como ciência física, química, biologia, psicologia etc, e só sobrou pra ela essa soltura de poder relacionar o que quiser com o que bem entender, essa visão ampla que não tem antolhos de forma alguma, nem do senso comum nem de um saber instituído.
É claro que a filosofia continua, está bem, obrigado. Isso porque tem uma essência e um caráter, que não se confundem com a mera liberdade metodológica ou do objeto de conhecimento. É a filosofia que vai dar a energia para impulsionar as ciências formalizadas e a própria teoria pós-moderna que é livre para ser o que quiser.
Mas mesmo com seu vigor e inclusive por causa dele a filosofia também se transforma o tempo todo.
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